Continuo lendo o livro de João Camilo de Oliveira Torres, que citei páginas atrás, e é impressionante como certas coisas continuam as mesmas:
''Essa atitude crítica em face dos valores tradicionais, das hierarquias sociais e do poder estabelecido tem sido, paradoxalmente, uma das razões do domínio de oligarquias e grupos parasitários. Um estudo das atitudes do eleitor em face da política, dos políticos e das observações dos jornais revelará as seguintes posições:
a) “não adianta mudar, todos são iguais”, daí serem inúteis os movimentos de renovação nacional, as campanhas patrióticas – será apenas mudança de nomes, não alteração de substância;
b) as críticas afinal são “intrigas da oposição” e, portanto, indignas de serem levadas a sério, valendo, ao caso, a filosofia da velhinha de Siracusa.
Acresce considerar a presença de hábitos forenses nos muitos advogados que são políticos: depois de um acalorado debate no júri, promotor e advogado vão tomar um cafezinho e comentar os sucessos da tarde, já que ambos, profissionalmente, cumpriram o seu dever, nenhum estando, pessoalmente, interessado no veredicto em si mesmo, que trata do destino de um desconhecido, cujo problema encararam tecnicamente, não existencialmente. Dois deputados podem liderar partidos adversos e serem bons amigos e sócios em seus negócios particulares: por isto, depois de um acalorado debate, tomarão seu cafezinho e comentarão amistosamente outras coisas. Ora, o povo não compreende isto, assim como não compreende o fato de os grandes jornalistas e políticos raramente pensarem a longo termo, empenhados que estão na luta, e assim mudarem constantemente de opinião. Se tomarmos Rui Barbosa e Carlos Lacerda, verificaremos que nenhum deles jamais considerou qualquer tema, em si, mas em face da problemática do momento.''
Livro foi escrito nos anos 60, analisa as ideias políticas até aquele momento e parece que foi escrito ontem.
Continua: ''Tudo isso contribui para criar um clima de generalizado nominalismo político, ninguém se interessando pelas ideias, pelas instituições, pelas soluções, mas pelos indivíduos. Esta a razão do acentuado “moralismo” da política brasileira: não importam as situações e instituições, mas os indivíduos – se bons ou maus. Duas fórmulas circulam: “todos os regimes são bons, se os homens que governam forem bons”; “todas as religiões são boas se bem praticadas”. É evidente: mas os regimes diferentes são processos, técnicas diferentes para fazer com que os melhores sejam governantes; as religiões são técnicas, digamos assim, destinadas a fazer com que os homens pratiquem o bem. É supor o efeito e fazê-lo razão de ser
da causa...''